Procedimento disciplinar – Brevíssimas notas

A lei geral do trabalho, tendo em vista o êxito organizacional da empresa, confere ao empregador os necessários (e adequados) poderes de direção e disciplina sobre o trabalhador.

O exercício do poder disciplinar laboral está, em regra, associado à imposição da disciplina laboral por via sancionatória não podendo, contudo, ser exercido de modo arbitrário pelo empregador.

A aplicação de uma qualquer sanção pelo empregador exige sempre o cumprimento de procedimentos e prazos específicos, previstos no Código do Trabalho (doravante, por economia, CT), bem como deverá sempre observar o princípio da proporcionalidade, atendendo à gravidade da infração e à culpa do trabalhador.

No exercício do poder disciplinar o empregador pode aplicar as sanções de repreensão, de repreensão registada, de sanção pecuniária, de perda de dias de férias, de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade e de despedimento sem direito a indemnização ou compensação.

Despedimento com alegada justa causa – Sanção mais gravosa e de última ratio.

O despedimento com alegada justa causa, é a sanção mais grave prevista na lei e que só poderá ser aplicada em caso de comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de laboral (artigo 351.º).

É de tal modo assim, que a lei prevê quais os comportamentos que poderão ser tidos como referência, não afastando outros, e que são a desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierarquicamente superiores, o desinteresse repetido pelo cumprimento dos deveres laborais, com a diligência, e de obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho a que está afeto, a lesão de interesses patrimoniais, as faltas não justificadas ao trabalho que determinem diretamente prejuízos ou riscos para a empresa ou cujo número atinja, em cada ano civil, 5 (cinco) seguidas ou 10 (dez) interpoladas, independentemente do prejuízo ou risco, as reduções anormais de produtividade, entre outras.

A lei exige ainda que, quando haja fundamento e se pretenda aplicar esta sanção disciplinar, seja adotado um procedimento que, entre outras, garanta o efectivo exercício do direito de defesa do trabalhador arguido.

Comunicação ao trabalhador – A nota de Culpa

Após o período de inquérito prévio (uma fase facultativa do processo), na qual o empregador recolhe os elementos de prova que possam instruir processo, a entidade empregadora deve comunicar, por escrito, ao trabalhador a intenção de despedimento.

A comunicação da intenção de despedimento deve conter a descrição, circunstanciada, no tempo, lugar e modo, de todos os factos imputados ao trabalhador, de modo a permitir-lhe o efectivo direito de defesa.

A nota de culpa, assinada pelo empregador ou por instrutor devida e expressamente nomeado para o efeito, constitui a peça essencial do processo disciplinar, pois é nessa peça que se delimitam, objectivamente, os factos imputados ao trabalhador arguido e só nesses se pode fundamentar a, eventual, decisão de despedimento com justa causa.

A nota de culpa, com comunicação expressa de intenção de despedimento, tem de ser notificada ao trabalhador, só produzindo efeitos a partir do momento em que o trabalhador, seu destinatário, dela toma conhecimento.

Com a notificação da nota de culpa, o empregador pode ainda determinar a suspensão preventiva do trabalhador, mantendo, contudo, o pagamento da remuneração como se esse se encontrasse a prestar trabalho, enquanto durar a suspensão, sendo que o único requisito para que esta suspensão preventiva opere é, para além da comunicação por escrito, que a presença do trabalhador na empresa se mostre inconveniente.

Direito de defesa – Resposta à nota de culpa

O trabalhador, uma vez regularmente notificada a nota de culpa, dispõe do prazo de 10 (dez) dias úteis para consultar o processo e responder às imputações formuladas na nota de culpa.

O direito de defesa do trabalhador é exercido através de resposta escrita à nota de culpa, na qual deve deduzir os fundamentos que considera relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos, negando-os ou explicando-os, podendo ainda juntar documentos e indicar as diligências probatórias que pretende sejam efetuadas para o esclarecimento da verdade, como por exemplo, arrolar testemunhas.

Note-se que a resposta à nota de culpa é um direito do trabalhador arguido e não um dever ou ónus, e, podendo essa ser uma peça essencial no processo, o facto de o trabalhador não responder não significa que concorda com a nota de culpa, nem, tampouco, pode ser usado contra si como confissão tácita.

Após a resposta à nota de culpa e realização das diligencias requeridas pelo trabalhador, naturalmente, levadas a cabo pelo empregador ou por instrutor do processo, devendo ser efetuadas em cumprimento do direito à efectiva defesa do trabalhador, não sendo o empregador obrigado a proceder à audição de mais de 3 (três) testemunhas por cada facto descrito na nota de culpa, nem mais de 10 (dez) testemunhas no total, é da responsabilidade do trabalhador assegurar a comparência das testemunhas à audição.

Quando exista Comissão de Trabalhadores e, caso o trabalhador seja representante sindical, à associação sindical respetiva, o empregador apresenta cópia integral do processo e essas podem, no prazo de 5 (cinco) dias úteis, juntar parecer fundamentado ao processo.

Decisão

O empregador dispõe de 30 (trinta) dias, após a realização da última diligência, para proferir a decisão de despedimento, se não o fizer o seu direito de aplicar uma sanção caduca.

Concluído o despedimento com alegada justa causa, apenas o tribunal judicial poderá pronunciar-se sobre a regularidade e licitude do mesmo, em acção especial, ficando a defesa dessa regularidade e licitude condicionada aos factos e fundamentos invocados na decisão de despedimento que, por sua vez, terão de reflectir as imputações em sede de nota de culpa.

Muita atenção:

Para a impugnação da regularidade e licitude do despedimento, a lei prevê um prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de o trabalhador ver caducado o seu direito de impugnar o despedimento.

João Oliveira Passos

Advogado

(Muito Importante: Este texto não é a solução de um qualquer caso concreto, mas, tão-somente, uma brevíssima dissertação em abstracto. Se tem alguma questão relativa a este assunto, consulte o seu Advogado.)